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Estamos ficando preguiçosos demais?

24 abr

A música dos anos 80 me encanta muito, pois acho muito interessante ver como eles evoluíram da simplicidade dos 60 para os arranjos complicadíssimos e progressivos nos 70, até chegar num ponto onde a música era simples mas tinha seu viés emocionante e épico.

Sim, épico. Uma época que até Xuxa tinha solo de guitarra, onde a rainha dos baixinhos voltava triunfante no refrão subsequente que costuma ser cantado um tom acima pra enfatizar. Apesar do uso excessivo do recém-inventado teclado que vinha com timbres pré-construídos, o que trouxe aquela sensação de “tecladinho Casio” a toda uma geração, sempre havia o momento de ansiedade, aquele em que se ouvia um solo triunfante ou um momento de silêncio pesaroso e curto, que deixava o refrão seguinte muito, mas muito mais emocionante.

Aos poucos, a música Pop foi perdendo essa vontade. Mais ou menos na época em que as gravações de estúdio deixaram de ser analógicas, lá no início dos anos 2000, esse costume se perdeu. É muito difícil ver alguma música no universo Pop se preocupar em ter um trecho criador de tensão e ansiedade. Aliás, cada vez é mais difícil ver músicas que tenham algo bom e divertido fora o refrão!

Acredito que parte disso deve-se ao costume, cada vez mais comum e radical, de rádios mundo afora picotarem músicas ao transmití-las, tocando só “a parte que importa” e reduzindo sua duração. Parece óbvio, pois se as rádios cortam, o ouvinte não fica sabendo que aquilo existiu, acha esquisito existir aquilo quando compra o disco, e por fim incentiva a gravadora a desencanar e fazer o que tá na moda hoje em dia: tocar o refrão infinitas vezes seguidas. O que leva, por sua vez, gravadoras a se preocuparem em fazer um ótimo refrão e largar o resto da música ao vento, colocando qualquer tapa-buraco só pra encher os ditos 3 minutos tradicionais. Não que isso não acontecia antes – Pink Floyd tinha suas músicas picotadíssimas desde os primórdios – mas ao menos havia a preocupação de ter o disco em casa.

Essa cultura radiofônica da pressa, da fila, da esteira na academia e do congestionamento reflete a luta que o rádio teve para sobreviver após deixar de ser o grande foco do entretenimento familiar com a chegada da televisão. Sua mutação mostra claramente como a cultura de massa evoluiu nas últimas décadas, com a tecnologia e as exigências de mercado nos empurrando a uma vida cada vez mais rápida. Depois de um período de incerteza e de certa crise, hoje o rádio conseguiu reaprender a se monetizar e entrou na era digital com louvor. Apesar disso, ele vem quase chegando àquele ponto visto no filme “O Demolidor”, clássico da sessão da tarde, onde os personagens adoram uma rádio onde toca jingles de 30 segundos.

Talvez não seja uma questão de preguiça, e sim de adaptação. Nós estamos vivendo cada vez mais rápido. Gravadoras têm se esforçado para sobreviver à era do mp3, testando métodos diferentes de vender seu peixe. Rádios querem arrebatar mais público, e pra isso querem artistas fortes que elevem sua audiência. Nós, como grande público, somos os únicos que podem fazer algo a respeito, seja para levar os indies para as rádios e paradas de sucesso, seja para voltar a colocar quem canta e faz música bem lá em cima. Mas pode ser que queiramos mesmo só ouvir jingles pro resto da vida, não?

 
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Publicado por em 24/04/2011 em Doideras

 

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